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Vida e Sociedade

Leone Rocha

leone.rocha@gmail.com

Harmonia dos Paradoxos

Seria o mundo quântico um universo social?

Compreender os fenômenos quânticos como uma realidade que somente pode ser concebida por meio da consciência pode reatar a ponte destruída entre as Ciências Sociais e a física

Colunistas  –  16/03/2023 16:18

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(Foto Ilustrativa)

Estabelecer uma comunicação entre os mundos micro e macro pode render bons frutos, além de reduzir a maléfica ortodoxia científica

 

Em 1975 foi lançado o livro “O Tao da Física”, escrito pelo físico austríaco Fritjof Capra (1939 - ) que traçou paralelos entre a física quântica e o misticismo oriental. O livro provocou abalo na ortodoxa comunidade acadêmica que tradicionalmente lida com paradoxos na forma exclusiva de “verdadeiro” ou “falso”, não abrindo margem para a harmonia dos paradoxos, que é o caso no misticismo oriental. Mas expliquemos melhor. Para isto, utilizarei a obra de outro físico teórico, dessa vez, o hindu Amit Goswami (1936 -).

Goswami, em seu livro “O Universo Autoconsciente”, lançado no Brasil em 2008 pela Editora Aleph, nos conta um breve resumo sobre as origens da física quântica. Até 1900 a física moderna estava bem estabelecida. O universo descrito pelas leis de Isaac Newton funcionava quase perfeitamente. Quase. Havia um fenômeno que incomodava os cientistas. Eles não entendiam como um raio do sol podia bronzear a pele e o calor do fogo de uma lareira não. Foi então que o físico alemão Max Planck (1858 - 1947) cunhou o conceito de “quanta/quantum”, afirmando que deveriam haver “pacotes/quantuns” de energia nos raios de luz que poderiam variar em quantidade.

Coube a Albert Einstein (1879 - 1955) provar a existência desses quantuns, os “fótons”, o que lhe rendeu um prêmio Nobel. A descoberta dos quantuns de energia mudou completamente a forma como os pesquisadores compreendiam a luz. Até então considerava-se que a luz comportava-se como uma onda. Os quantuns, o fóton, são um corpo, e a luz, de agora em diante passou a ter uma natureza dupla: onda e corpo. Daí o paradoxo. Para enlouquecer ainda mais a cabeça dos cientistas, a forma “onda” e a forma “corpo” das partículas parecia manifestar-se das mais diversas maneiras possíveis. Buscar descrever como uma partícula subatômica materializa-se ora como onda, ora como corpo veio a ser o Santo Graal da física contemporânea.

Mas o que tem a ver as Ciências Sociais com isso? Primeiramente, a própria origem da sociologia enquanto disciplina moderna está diretamente ligada à física. Aquele a quem é designado o título de “pai” da sociologia, o francês Auguste Comte (1798 - 1857), a criou seguindo o modelo da física, objetivando criar uma “física social”. Ele utilizou conceitos como “Estática Social” e “Dinâmica Social”, inspirado naquela que teria sido a primeira ciência propriamente dita. Realizado este adendo, voltemos a Goswami.

No livro “O Universo Autoconsciente”, Amit Goswami argumenta que os paradoxos da física quântica somente podem ser explicados por meio do “idealismo monista”, que afirma que a consciência é a determinante dos fatos materiais; é a consciência que determina a forma “onda” ou “corpo”, ideia originalmente proposta pelo matemático húngaro John von Neumann (1903 - 1957). Goswami afirma o seguinte: “Se queremos compreender o comportamento de objetos quânticos, contudo, parece que precisamos introduzir a consciência - nossa capacidade de escolher - de acordo com o princípio da complementaridade e a ideia da mistura sujeito-objeto” (pág. 67). A consciência surgiria como fator explicativo para explicar o “colapso da onda” (como é chamada a passagem da forma onda para a forma corpo/partícula), pois o universo quântico não se enquadra de forma alguma no universo da física moderna; ele, absolutamente, não possui certezas, apenas probabilidades.

Oras! Consciência? Comportamento? Entramos assim em assunto humano, social. No desenvolvimento das Ciências Sociais contemporâneas, um de seus temas de maior preocupação foi a relação ação/estrutura social. Como desenvolvem-se e originam-se as ações sociais na sociedade? O que influencia mais no desenrolar dessas ações? O indivíduo ou a estrutura social? Trata-se aqui, da mesma forma, de uma espécie de “colapso”. Como uma potencialidade de formas, possibilidades, materializam-se nas ações dos sujeitos sociais? Várias foram as teorias que procuraram dar conta dessa problemática. Na sociologia temos o conceito de “habitus”, do francês Pierreu Bourdieu (1930 - 2002); o conceito de “estruturação”, do inglês Anthony Giddens (1938 - ); na antropologia temos os estudos do americano Marshall Sahlins (1930 - 2021); e na Ciência Política temos, por exemplo, os estudos no campo da “Teoria da Escolha Racional”.

Assim, acredito que compreender os fenômenos quânticos como uma realidade que somente pode ser concebida por meio da consciência pode reatar a ponte destruída entre as Ciências Sociais e a física, estabelecendo uma comunicação entre os mundos micro e macro que pode render bons frutos, além de reduzir a maléfica ortodoxia científica.

> Fonte: Goswami, Amit. “O Universo Autoconsciente. Como a Consciência Cria o Mundo Material”.
São Paulo: Editora Aleph, 2008. 

 

Por Leone Rocha  –  leone.rocha@gmail.com

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