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Vida e Sociedade

Leone Rocha

leone.rocha@gmail.com

A Classe Média no Espelho

A luz do poder deixa tudo belo: por um projeto de Brasil

Não temos sentimento de unidade, não temos sentido de povo; somos indivíduos isolados em busca de ser Elite sem preocupação com quem está do lado

Colunistas  –  07/11/2024 19:00

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(Foto Ilustrativa)

Devemos construir um projeto de Brasil, pelo Brasil, para o Brasil, com o Brasil

 

Estou lendo um livro do sociólogo Jesse Souza chamado “A Classe Média no Espelho”, Editora Estação Brasil, 2018. Nele o autor traça um raio-x de um setor da população brasileira, seus anseios, origem, preconceitos, bem como pinça o imaginário da população brasileira sobre questões de classe social e modos de vida, além de questões basilares como racismo, corrupção, herança portuguesa, entre outros tópicos. Pode-se perceber na leitura como o viés de classe permeia os sentidos e percepções do brasileiro médio nas suas interpretações sobre si mesmo e o outro. Para ser considerado “gente”, ele deve possuir acesso a uma determinada gama de bens e serviços específicos e de privilégio de uma elite. A partir de então, o que é praticado por essa elite possui um status superior, elevado, objeto de prestígio e admiração por parte dos que estão nas classes inferiores.

Assim, no Brasil, o que a classe superior faz é belo, o que a classe inferior faz é desvalorizado. Por exemplo, a corrupção. Considerada uma chaga da cultura brasileira, é comumente atribuída ao comum do cidadão, mas passa despercebida quando realizada pelos grandes empresários e setores de serviço da sociedade.

Penso, quanto a isso, na malandragem. Extremamente condenada em diversos campos da sociedade brasileira por diversos segmentos sociais, foi instrumento de garantia de sobrevivência de grande número de excluídos do sistema. Mas, pensemos, o que são as campanhas de marketing, vendendo ilusões, senão uma grande malandragem? Quantos cursos e técnicas de venda existem para “fisgar” o consumidor e realizar uma compra? Isso não é uma malandragem? Claro que não! É o mercado! E o mercado tem legitimidade, é belo.

Outro caso. Sou antropólogo do Incra no Amapá. Lido com a regularização de territórios quilombolas. Nas comunidades quilombolas é bastante comum o conflito entre os comunitários, o desentendimento. As comunidades negras são taxadas de “não se entenderem”, “os negros brigam muito entre si”. Ora, quantas partilhas de herança entre brancos levam anos para chegar a um consenso? Se em uma única família muitas vezes é difícil haver harmonia, o que não dizer de uma comunidade inteira? Não é exigir muito tal consenso? Mas, mais uma vez, como são parte de uma minoria, excluídos, sofrem preconceito, são “menos gente”.

O Brasil é um país de profundas desigualdades sociais, isso não é novidade. Talvez a maior síntese disso seja a música da Legião Urbana, “Perfeição”, que afirma um “Estado que não é nação”. Não temos sentimento de unidade, não temos sentido de povo. Somos indivíduos isolados em busca de ser Elite sem preocupação com quem está do lado. E nossa Elite muito menos tem um projeto de nação, somente pensa em reproduzir-se ad infinitum e se espelhar nas elites estrangeiras. Devemos construir um projeto de Brasil, pelo Brasil, para o Brasil, com o Brasil.

 

Por Leone Rocha  –  leone.rocha@gmail.com

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