(Foto: Divulgação)
“É assustador ver essa onda conservadora por todo lado, mas temos que continuar fazendo arte pra lutar contra isso”
Vencer obstáculos, superar as inseguranças. O sucesso de um grupo artístico, seja ele de teatro, música ou dança, não depende apenas de talento, como também muito da força de vontade, do empenho, da disciplina e da persistência de seus integrantes. No início, para esses profissionais, vale buscar inspiração em grandes intérpretes e compositores, atores e autores, bailarinos, e seus trabalhos conhecidos do grande público. Mas o caminho para o reconhecimento exige que se inove, que se crie. Seja uma banda musical, uma companhia teatral ou de dança iniciantes, não vai ter seu caminho para uma carreira bem sucedida encurtado, focando-se apenas em copiar artistas que já estão fazendo sucesso. Há possibilidades de se destacarem no meio se, ao invés disso, buscarem apenas influência nesse artista, procurando criar um estilo diferente. Temos visto muito isso aqui na região, principalmente entre as categorias artísticas que concorrem ao Prêmio OLHO VIVO.
No sul da Irlanda, a 130 km da capital Dublin, a pequena cidade medieval Kilkenny abriga um tesouro arquitetônico e histórico em seus diversos museus e várias outras opções culturais. Abriga também dois estúdios famosos de animação, e é exatamente em um deles que dá início à história de um grupo de amigos, animadores e desenhistas, que resolveram unir seus outros talentos artísticos e estão iniciando uma banda musical. A trajetória deles não está sendo muito diferente da fase inicial de muitas bandas de sucesso. Os integrantes da banda Fantasma buscaram no estilo folk sua fonte de inspiração e conseguem conciliar o tempo entre o trabalho de animação com os ensaios da banda, composta por cinco integrantes brasileiros e um espanhol, além da produtora artística (Bárbara Procópio), que é também uma das animadoras no estúdio de animação. Os instrumentos que eles utilizam são ukulelê e banjolelê (Maria), banjo (Felippe), violão (Paulo), acordeão e gaita de boca (Carlos Mateus), baixo (Gabriel) e violino (Clara). A banda, que começou fazendo apresentações apenas para os funcionários do estúdio de animação, hoje se apresenta em barzinhos noturnos, ainda na condição de ensaio aberto, na acolhedora cidade de Kilkenny.
Confira a entrevista
Vamos começar por uma pergunta bem clichê, mas necessária: O nome tem alguma relação com a Irlanda? Por que Fantasma?
O nome vem da nossa primeira tentativa de formar uma banda. Quando nos conhecemos trabalhando em um estúdio no Rio de Janeiro, seis anos atrás, nós formamos uma banda chamada Cabra Fantasma, mas nunca chegamos a fazer um show. Quando nos reencontramos no estúdio aqui na Irlanda, resolvemos retomar a banda, e por algum motivo deixamos o Cabra pra lá e ficamos só com o Fantasma mesmo. Acho que pra facilitar pro pessoal que não fala português.
O que vocês poderiam nos contar do cenário musical na cidade onde estão, e do público?
Na Irlanda, parece que todo mundo toca algum instrumento. Quase toda rua tem um músico tocando durante o dia, e quase todos os pubs têm música ao vivo à noite. Aqui em Kilkenny tem um festival de música que acontece nos maiores pubs e nos teatros da cidade, e se tudo der certo um dia vamos participar! O público daqui é muito animado e quando tocam as músicas tradicionais irlandesas todo mundo canta! Tem muitas apresentações de música tradicional aqui.
O que vocês escutam que serve de influência?
Nós escutamos muito folk americano, e algumas bandas independentes que encontramos na internet. Acho que a principal influência nesse reencontro nosso foi a banda Spirit Family Reunion. Mas uma vez que se descobre uma banda, tu percebe que alguém da banda tem um projeto paralelo, e aí alguém desse projeto paralelo tem alguma outra banda... e por aí vai. Assim vamos descobrindo várias influências! Twain, Hurray for the Riff Raff, Johnny Cash...
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"A música popular brasileira é muito rica. Acreditamos que se fosse ensinado nos escolas a história da música, se quebrariam vários preconceitos".
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Bandas de folk são ferramentas importantes para se propagar a história e o folclore de várias regiões e também em nível internacional. Vocês têm alguma pretensão de espalhar a cultura brasileira e a espanhola aí onde estão, já que essa é a nacionalidade de vocês?
Nós queríamos tocar algumas músicas em português, mas não decidimos por nenhuma ainda. Sempre depois dos ensaios o pessoal toca umas músicas sertanejas por diversão. Provavelmente vamos tocar Amarante ou Ze Ramalho.
O papel do artista é também contribuir para a valorização cultural do país. O folk, por ser fundamentado em elementos folclóricos, nos remete a um passeio pela história, mas no Brasil o público ainda é bem pequeno. Vocês acreditam que, se introduzido em massa na maioria das regiões de um país, ele possa ser também um elemento importante na educação, de forma a oportunizar a elevação cultural em regiões mais carentes a um outro patamar?
A música popular brasileira é muito rica. Acredito que se fosse ensinado nos escolas a história da música, se quebrariam vários preconceitos. Agora, o folk, como música de protesto, acho que nesse momento seria muito importante difundir toda resistência artística na época da ditadura... Mais atual do que nunca, infelizmente.
Vocês traçaram alguma meta futura para a banda?
Nossa meta era fazer um show em um pub especifico aqui da cidade chamado Hole in the Wall, uma vez que já fizemos o show lá, mas agora a meta é entrar no festival de música da cidade.
Qual paixão é maior: o desenho animado ou a banda de folk?
A paixão maior vai estar sempre onde a gente possa se colocar mais. Claro que é um prazer diferente tocar, sentir a resposta do público imediatamente. Mas dá muito orgulho também ver um filme pronto depois de anos trabalhando nele. Difícil escolher.
Vocês estão sendo entrevistados para um jornal online onde o maior número de acessos é feito por diversas categorias do meio artístico, e tendo em vista o cenário de repressão a que a classe artística está sendo alvo no momento, gostaria de terminar essa entrevista com um recado de vocês para o pessoal que está lendo. O que falar para os artistas?
Resistam! É assustador ver essa onda conservadora por todo lado, mas temos que continuar fazendo arte pra lutar contra isso. Obrigado pela oportunidade da entrevista e obrigado também a quem estiver lendo. Aproveitando para dizer que, se alguém tiver interesse em ver essa nossa arte, é só clicar no link.