(Fotos: Filme “Incondicional” - Thyago Rangel; Festival de Veneza - Damin Laing)
Interpretação intensa: Aymara Limma no filme “Incondicional”, drama inspirado em uma questão mundial muito grave, que faz muitas vítimas, a alergia alimentar
Importantes profissionais passam pelo festival de cinema mais antigo do mundo: o de Veneza. Este ano, o evento entra para a história com um diferencial: não teve o público ao lado do tapete vermelho, em decorrência da pandemia do novo coronavírus (Covid-19), nem o time de celebridades considerados classe “A”. Mas seguiu em frente, com a presença de grandes nomes da indústria cinematográfica europeia obedecendo aos protocolos de segurança e com lugares reduzidos pela metade.
A mulher com quem bati um papo é daquelas que estão sempre buscando novos desafios. Mora na Califórnia e já esteve no Festival de Veneza. Desta vez, o vírus a impediu voltar à Califórnia, quando terminou o mestrado que fazia em Veneza, e teve a felicidade de acompanhar bem de pertinho o festival em tempo real. Eu acompanhei as façanhas de Aymara Limma, que tive o prazer de conhecer recentemente numa maratona audiovisual, através de seus informes e fotos no seu Instagram e Facebook. Nossos contatos pelo WhatsApp a revelaram uma pessoa carismática, de uma humildade muito acima da média para uma pessoa que vive num meio glamouroso e que tem muita coisa interessante para contar. A entrevista de hoje é com todas as Aymaras que existem dentro da Aymara Limma: a Aymara atriz, diretora, produtora, editora...
Confira a entrevista com Aymara Limma
Oi, Aymara! Uma honra ter você aqui na minha coluna. Conta um pouco pra gente quem é a Aymara Limma na intimidade?
Eu me considero uma mulher tímida, calma e tranquila, claro que às vezes muito acelerada, afinal sou ariana e tenho DDA (Deficite de Atenção). Amo trabalhar, viajar, fotografar, velejar, mergulhar e conhecer novas pessoas. Sempre gostei de fazer trabalhos voluntários e ajudar o próximo.
Como tudo começou?
Ainda adolescente fazendo Tablado no Rio de Janeiro, dali, fui convidada para fazer testes para protagonizar a minissérie “Capitães da Areia”, para a Bandeirantes, em 1989, dirigida pelo Walter Lima Junior, cujo personagem acabou ficando para outra atriz, mas aí caí no gosto da equipe dos testes de elenco e criaram um personagem para mim na minissérie.
Qual foi o personagem?
Era um personagem de peso leve. Eu fazia par romântico com André Gonçalves, e por sinal, foi também o primeiro trabalho dele na TV.
E daí, por que não continuou na TV? Não gostou?
Ah... Surgiram outras coisas no caminho. Quando terminei a minissérie, até fui chamada para outro trabalho, mas conheci uma pessoa e me encantei. Meu primeiro grande amor: o músico argentino de reggae Diego Blanco, do grupo Los Pericos. Eles eram sucesso na Argentina, larguei tudo e fui pra lá, para a Argentina, curtir essa paixão. Mas meu pai estava com câncer e acabei retornando ao Brasil.
Você estudou teatro na Inglaterra. Como foi?
Eu perdi meu pai. Fiquei meio sem norte. Fui para o Canadá, e depois resolvi ir para a Inglaterra fazer teatro e, a despeito do pessimismo das pessoas que falavam que eu nunca conseguiria atuar em inglês, transferi a faculdade de marketing que fazia no Brasil para Londres e depois, de Londres a transferi para a Califórnia, onde fiz administração de empresas com ênfase em marketing e moda. Cheguei lá com 400 dólares no bolso. Ali eu teria que trabalhar para sobreviver, pois minha mãe pagaria apenas o curso na faculdade e alojamento. Aí eu precisava começar de alguma forma pra entrar no meio, né? Chegar depois onde eu queria. Comecei a trabalhar de graça em desfile de moda, ajudando a vestir as modelos, em seguida me convidaram para ajudar na produção de desfiles de moda, logo depois comecei a produzir os desfiles de moda para a grande loja de departamento Nordstrom. Acordava às 5 da manhã nos fins de semana porque eu era responsável pelos desfiles em várias cidades na Califórnia.
E como chegou ao cinema americano?
Eu fiz cursos. Estudei também com grandes nomes em Hollywood, na Beverly Hills Playhouse, com Milton Katselas e Jeffrey Tambor. Aí consegui um agente, o que me rendeu a oportunidade de fazer um filme com Nicolas Cage, “Cidade dos Anjos”, e fui dirigida pelo grande Brad Silberling.
E daí para o próximo filme foi mais fácil?
Quando estive no Brasil visitando a família, fui convidada para um participação no “Linha Direta”, da Rede Globo, mas voltei logo para Los Angeles e, quando tive que passar um tempo no Brasil para trocar o meu visto, acabei sendo convidada para fazer no teatro a protagonista feminina de “As aventuras de Tom Sawyer”, onde contracenei com Pitty Webbo que ficou duas temporadas e ganhou três prêmios Maria Clara Machado. Inclusive, o de melhor espetáculo infantil.
Conta um pouco sobre sua trajetória no teatro, além de “As aventuras de Tom Sawyer?
Fiz algumas outras peças, inclusive no Tablado. Em Los Angeles fazia muito “showcase”, apresentações no teatro para produtores de elenco e profissionais do meio. Era incrível.
Qual a sua preferência em atuar: cinema, teatro ou TV?
Eu amo atuar em cinema, teatro ou TV. Mas para ser honesta até comigo mesma prefiro cinema, acho que temos mais tempo para nos aprofundar na personagem e normalmente podemos trabalhar mais com o diretor.
Você também teve uma experiência num best-seller. Como foi isso?
Eu conheci a Ana Beatriz Barbosa Silva quando voltei para o Brasil, ela tinha me diagnosticado com DDA (Déficit de Atenção), e como ela sabia que eu tinha contatos me pediu para tentar conseguir uma editora para editar o livro “Mentes Inquietas”, mas todas as quatro editoras que mandei o livro não se interessaram por ele. Era o primeiro livro da Ana Beatriz. Com todas as negativas, ela me perguntou se eu não gostaria de pegar esse desafio e editar o livro. Eu não sabia nada sobre o assunto, mas acreditava nela, e, como uma boa ariana, topei. Trabalhei muito para fazer, para obter sucesso, e consegui. O livro virou best-seller por 13 edições comigo, ficou entre os 10 livros mais vendidos do Brasil pela revista “Veja” e foi vendido para a Editora Gente. E aí eu abri uma editora, a Editora Five Star, em parceria com a gráfica Imprinta Express. Nossa Editora lançou autores de sucesso, como Eduardo Moreira, Artur da Távola e Kleiton Ramil.
E daí, por que não continuou nessa linha de editoração?
Ah, eu queria era atuar. Larguei tudo de novo no Brasil e retornei à Califórnia com minha fiel escudeira: minha Golden Retriver Nina. Pra recomeçar do zero e fazer o que realmente amava. Então, escrevi o filme “Te amo! Shabbat Shalom”. Trabalhei intensamente na produção dele. Era um curta-metragem. Uma comédia romântica. E ganhei com ele um prêmio de melhor curta por júri popular em sua primeira exibição nos Estados Unidos em 2014, e ele foi selecionado para um festival na Suíça, e em 2015 foi selecionado para competir no Los Angeles Brazilian Film Festival.
O que te inspirou a escrever o filme “Te amo! Shabbat Shalom”?
Eu me apaixonei pela Kabbalah e lá me apaixonei por um judeu. Mas como eu não era judia, ele não podia namorar comigo e foi esse sofrimento que me inspirou a escrever essa comedia romântica.
Você chegou a lançar um desses filmes no Brasil?
Ah, sim. O “Te amo! Shabbat Shalom”, após concorrer e ficar entre os finalistas do Los Angeles Brazilian Film Festival, em 2015, concorrendo na categoria Special Screenings do festival, achei que precisava lançar no Brasil, contatei o Midrash, o centro cultural do rabino Nilton Bonder. Eles adoraram o filme o meu filme e o lançamento foi no Midrash do Leblon, depois da projeção tivemos um debate maravilhoso mediado pelo jornalista e roteirista Wladimir Weltman, com a jornalista Shirley Nigri Farber, com o jornalista e criador do termo bossa nova, Moyses Fuks, com o escritor de livros sobre judaísmo Elias Salgado e euzinha, atriz e autora, produtora e diretora do filme, a única não judia no debate. Foi realmente um sonho realizado.
Aymara Limma e Fernanda Cheleghin em "Incondicional"
Entre o “Te amo! Shabbat Shalom” e seu próximo filme, houve um espaço de tempo. O que você aprontou nesse tempo?
Pois é. Eu estava mal. Minha cachorra Nina faleceu e eu resolvi retornar ao Brasil. Aí, fui fazer outra coisa diferente: me voltei à pintura multimídia com vídeo e fotografia, onde fiz uma exposição intitulada “Open your heart” no Rio, que reuniu 42 pinturas, 10 fotografias e vídeo que retratavam o amor e as belezas naturais com imagens também do Rio de Janeiro. Foi muito bom. Investi bastante, mas vendi bastante também, recuperando meu dinheiro investido.
Você fez um outro filme. Poderia falar dele?
Fiz o filme “Incondicional”, um drama inspirado em uma questão mundial muito grave, que faz muitas vítimas: a alergia alimentar. Ambientado dentro de um veleiro no meio da Baía de Guanabara, eu interpreto Janaína, uma mãe desesperada que vai atrás de uma celebridade, a apresentadora Renata Luz (Fernanda Celleghin), quem ela acredita ser a responsável pela morte de seu filho alérgico, de 5 anos. “Incondicional” fez sua estreia em julho de 2016 no Centro Cultural Gabriel Varela (ICRJ). Depois, o filme foi exibido nos CCBBs de Belo Horizonte, São Paulo e Brasília; na Universidade Unisinos, Campus Porto Alegre; e no III Simpósio do Núcleo de Estudos sobre Criança e Adolescente, grupo de pesquisa da UFSJ, na Universidade do Estado de Minas Gerais, Campus Divinópolis. É um projeto que me toca profundamente e por isso ainda continuo trabalhando nele em uma nova versão especial para fazer o circuito de festivais de cinema.
Você fez também um documentário, como é isso?
Acho que passei mais de sete meses filmando uma aventura ao mar "Viver sem dormir", em que navego sozinha com o italiano Guido Consigli, em um belíssimo veleiro de 55 pés, do Rio de Janeiro ao Caribe, na Ilha de San Mateen. Eu sempre fui velejadora. Quando era jovem competia, cheguei a ser vice-campeã mundial de iatismo, mas nunca tinha passado mais que 8 horas velejando direto de um ponto a outro. Apaixonada pelo nosso Brasil e sem conhecer o Caribe, resolvi filmar essa aventura e fazer o meu primeiro documentário. Com lugares maravilhosos, como Abrolhos, Bahia, Fernando de Noronha, várias ilhas paradisíacas do Caribe e um cozinheiro italiano de mão cheia. Mas o mar é imprevisível e fez desta aventura uma viagem de superação. Imagina mais de duas semanas navegando sem parar, longe de tudo e de todos? Um documentário muito rico, apesar do imprevisto em Abrolhos, onde a minha máquina e o meu Iphone molharam. Como perdi o equipamento principal, acabei filmando o que podia com o Motorola e com a Go Pro. Ainda tenho de terminar de filmar alguns takes e algumas entrevistas que ficaram impossíveis de serem feitas sem o equipamento que perdi.
E sobre seu mestrado em Veneza, foi na área do cinema também?
Sim, fiz um mestrado de cinema em Veneza.
Aymara no Festival de Veneza 2018
Você postou no Instagram que suas fotografias do festival de Veneza foram publicadas num artigo. Fiquei curiosa pra saber se você vendeu as fotografias (que por sinal estão lindíssimas) ou cedeu. Conta um pouco sobre isso pra satisfazer a curiosa.
Obrigada, fiquei muito feliz de ter conseguido fazer as fotos. As que fiz da Cate Blanchett e do Matt Dilon, eu cedi. Estava muito empolgada e com muito trabalho, ainda não me organizei para vender fotos online. Tenho que aprender como vender fotos online. As únicas fotos que vendi até agora foram na minha exposição multimídia “Open your heart”.
Conta pra gente como foi sua aventura no Festival de Veneza deste ano. Você estava presente por alguma instituição? Sua função dentro do festival era de espectadora ou algo mais?
Eu amo festivais de cinema, já estive várias vezes no Festival de Cannes, de Karlovy Vary, e essa foi a minha terceira vez no Festival de Cinema de Veneza. Quando eu morava em Los Angeles fui convidada para escrever alguns artigos sobre cinema, aí me pediram para escrever sobre o Festival de Cannes e depois o Festival de Veneza. Este ano, com a pandemia, foi um pouco diferente, porque me pediram para cobrir o festival e fazer conteúdo para lugares diferentes, foi aí que aproveitando a minha paixão pela fotografia consegui também fazer algumas fotos históricas. Fiz muitas fotos que infelizmente por falta de experiência não foram exploradas corretamente, afinal é um ramo novo pra mim. Tive quatro matérias publicadas e estou feliz, fiz tudo que pude.
O festival foi incrível, mesmo com as limitações e o excesso de trabalho. O fato de já ter participado do festival três vezes me ajudou muito, mas mesmo assim, dependendo dos seus objetivos, um festival de cinema é sempre muito intenso, seja vendo os filmes, ou fazendo network, ou cobrindo o festival ou com aquele glamour. Sempre muito trabalho e poucas horas de sono. O Festival de Veneza em especial é localizado na Ilha do Lido, eu demorava quase uma hora para chegar no festival (entre pegar o barco e etc.). Fora isso, este ano, com a exigência de uso de máscara o tempo todo, mais de 10 horas diretas sem parar, entre filmes de toda parte do mundo, eu chegava em casa e ainda tinha que editar fotos, escrever e falar com a equipe no Brasil. Respeito cada vez mais a vida de um jornalista, um fotógrafo, um comentarista. Na verdade, eu respeito cada vez mais todos os trabalhos e todas as profissões. São todas importantíssimas.
Você tem algum projeto futuro?
Nossa, tenho vários. Cada um caminhando na sua própria velocidade. Resolvi não estressar, afinal, estou fazendo tudo o que consigo fazer. O meu tempo tem que ser dividido entre os dois documentários em andamento e um curta que filmamos em Cannes no ano passado, que agora está em fazer de finalização.
Adorei conhecer você e espero um dia podermos nos encontrar. Quem sabe até fazermos um trabalho juntas. No mínimo eu aceito carregar suas bagagens quando seu próximo filme for indicado ao Oscar, tá? Um prazer realmente ter feito, não uma entrevista (porque minha coluna é bem informal), mas este bate-papo com você. E obrigada por aceitar. Caso queira deixar algum link para algum trabalho seu, aproveita esse espaço. Um grande beijo, obrigada novamente e fica na paz de Deus.
Eu que agradeço, foi um prazer enorme conhecer você, espero que em breve a gente possa tomar um café ou comer um bife à milanesa em Milão. Amo bife à milanesa. Estou começando a tocar uma conta no Instagram sobre as minhas paixões.
Aymara atriz: aymaraofficial | Aymara artista: byaymaralimma, quem quiser, estamos voltando pra lá. Beijos e muito obrigada, fica com Deus.