(Fotos: Divulgação)
Performances nas ruas de Resende em 2011
Para a estreia desta coluna gostaria de parabenizar ao Cláudio Alcântara por essa corajosa empreitada e desejar a ele, como a todos os colaboradores, sucesso!
Tomei como mote inicial desta coluna a mobilização global em torno de um conceito: a tomada da cidade como produção artística. Por que tantos artistas, entre atores, músicos, poetas, circenses, performers, estão cada vez mais ocupando as silhuetas urbanas com seu modo de pensar, fazer e agir, ou seja, com sua Cultura? Por que esses artistas estão escolhendo as ruas, o espaço público como seu território de ação? Segundo André Carreira, professor doutor da Udesc (Universidade Estadual de Santa Catarina), “a ideia de tomada como ocupação não significa, necessariamente, uma atitude anárquica de rebeldia, comumente encontrada em grupos marginais. Essas intervenções propostas são uma interferência na lógica da cidade, uma intromissão ao uso cotidiano do espaço”.
Toda forma artística que se realiza num centro urbano propõe uma “desordem” que interfere nos fluxos centrais estabelecidos. De acordo com a nova Secretaria de Economia Criativa, criada dentro do Ministério da Cultura, em junho deste ano, a Cultura representa hoje, em nosso país, o principal ativo econômico, defendendo a ideia de que esses ativos não são, nem deverão ser, apenas um patrimônio material, como prédios, museus, palácios, a arquitetura urbana, suas formas e contornos, além de bens tangíveis, como livros, quadros, filmes e produtos diretamente “consumíveis”. Esses novos ativos econômicos, pertencentes à Economia Criativa são representados pelo patrimônio intangível, pelos bens simbólicos e imateriais, como o conhecimento, a forma de viver e o saber.
Uma nova revolução
Essas noções da cidade concebidas por arquitetos, urbanistas e pelos próprios cidadãos são explodidas, “desorganizadas”, ainda que de forma provisória e fragmentada. Com o avanço da rede de alcance mundial (tradução da sigla www - word wide web), uma nova revolução se inicia. A revolução informacional ou informatizada ou a Revolução da Era da Informação. A rede permitiu a criação de novos saberes, mais do que isso: a produção e distribuição desses conhecimentos. A noção de rede nos trouxe a percepção do espaço público por outro prisma. Tudo o que é posto na rede é público. Mas virtualmente falando não é complicado perceber esse aspecto. Afinal, estão todos (os que são “socialmente incluídos” por serem informatizados) interconectados virtualmente, mas e na real? Realmente estão conectados?
Agora voltemos ao mote da coluna de hoje: Por que vivemos esta onda de ocupação urbana com as artes? Por que voltar às ruas para fazer delas um laboratório de observação cultural? Que extratos sairão daí?
Essa mesma rede citada acima permitiu que artistas e grupos se associassem em forma de Coletivos. Essa formatação de inúmeros coletivos de coletivos desencadeou novos modelos de organização social, calcada na ausência de liderança vertical, como nas grandes empresas, e formatando-se em organizações com uma estrutura organizacional horizontal. Esse novo modelo de liderança desperta um princípio de cidadania, onde todos têm espaço para serem ouvidos, como deveriam ser os espaços públicos, aqueles espaços destinados ao povo, como ruas e praças, e não aos poderes ditos públicos. Tomando essa articulação virtual como ferramenta organizacional para a ocupação do espaço urbano real, novas interrogações vêm surgindo, novos questionamentos como: O que é público? O que é privado e o que é coletivo? Para encaminhar essa discussão para projetos reais que estão acontecendo agora, me chamou a atenção a mobilização realizada por um coletivo de Resende, o Observatório da Interrogação.
Compartilhando experiências
Percebendo os impulsos decorrentes desse modelo desenvolvimentista, esse grupo de artistas transparece seu “foco de atuação” na relação humana - no encontro. Ao abranger a arte e a rua, eles encontraram motivos instigadores para propor suas experiências. Em 2011 foi criado o Observatório da Interrogação como uma proposta experimental em artes com a intenção de aprofundar a ação coletiva urbana, potencializar a intensidade do encontro compartilhando percepções e experiências.
O diálogo artístico com o ambiente se deu através de ações, performances, sons, apropriações, interferências, ativismo, instalações, pirações, objetos, situacionismo, materiais em suporte gráfico e intervenções e ocuparam as ruas, pontes e praças da cidade. Segundo George Sander, um dos organizadores do projeto, “o ato de interrogar o espaço da cidade é um claro posicionamento ideológico que se funda como declaração de direitos do cidadão sobre as normas do espaço público e de historização desse espaço”. Expandir essa ideia é possível quando ao se pensar que ocupar a silhueta da cidade é, de fato, propor algo que extrapola o ato de “levar o teatro às ruas”, é tomar a rua como matéria do próprio espetáculo.
Liberdade e autonomia
Sander ainda acrescenta: “Somando novos esforços neste ano de 2012, o Observatório da Interrogação realizará sua segunda edição da Mostra de Arte Urbana, pensando nas mesmas diretrizes de cultura livre e arte colaborativa, e já realizando algumas intervenções pela cidade, agrupa novos fazedores e apoiadores num resgate de valores de liberdade e autonomia”.
Para encerrar, concluo dizendo que os conhecimentos vivos e as competências dos seres humanos estão prestes a ser reconhecidos como a fonte de todas as outras riquezas, e nesse sentido, a finalidade principal das novas tecnologias da comunicação é dar suporte aos grupos humanos para a construção de coletivos inteligentes, fazendo do ciberespaço um local de desenvolvimento de potencialidades sociais e cognitivas explodindo para o espaço real de convívio urbano um resultado de interrogações profundas sobre a presença do cidadão e suas interferências na sociedade. Evoé e até a próxima.
> Referências: Sala Preta, Mapeia, Semana Experimental Urbana, Coletivo CDM