(Fotos: Divulgação)
Chris, também conhecido como
Alex Supertramp, foi seu próprio super-herói
Antes de começar a falar do livro da semana, gostaria de deixar clara a intenção da coluna. Nem sempre falarei de livros atuais. Há obras de 50 anos atrás que continuam a fazer tanta movimentação nas livrarias quanto foi ou até mais do que "Harry Potter", "Crepúsculo" e "Cinquenta tons de cinza". Títulos que não seguem moda nem tendência. Alguns escritores pegam carona para a fama, falando do assunto e gênero do momento. Não julgamos pela capa ou pelo nome do autor; às vezes, o conteúdo começa na sétima página; às vezes, não é tão vendido nem é uma trilogia, mas a história, um personagem, a moral, o cheiro da página, toca cada um de uma forma pessoal e única - o que nenhum colunista conseguiria colocar num jornal.
"Os livros podem ser divididos em dois grupos: aqueles do momento e aqueles de sempre". John Ruskin - poeta, critico, desenhista e escritor britânico (1819-1900)
Por um espírito livre
Christopher Johson McCandless, também conhecido como Alex Supertramp, foi seu próprio super-herói. A história de Christopher é contada de forma filosófica e morna. Após se formar em história e antropologia em 1990 Chris abandona tudo, carro, dinheiro, cartões de crédito família, amigos e uma vida normal assim ditada pela sociedade e começa a jornada do mochileiro de um pequeno estado da Califórnia até o Alasca. Esse era o plano de Chris.
Foram dois anos livres da forma que bem quis, e criou um nome ou talvez algo que pudesse mais uma vez saciar seu alter-ego: Alexander Supertramp. Sem residência própria, trabalhando apenas para ter dinheiro suficiente para prosseguir com sua jornada. Quando próximo do seu destino, se conscientizou de que estava preparado para a verdadeira natureza selvagem, Alasca.
A responsabilidade de contarmos a história
Emile Hirsch interpretando Chris McCandless no filme de 2007
O autor do livro, Jon Krakauer, conseguiu, além do bruto e excepcional da história, trazer outro diferencial que deixa tudo mais emocionante e nos garante a autenticidade da lenda. O autor refez todos os passos da jornada de Chris e no livro é possível observar os trechos de textos reais, escritos pelo próprio Chris, e depoimentos dos familiares e de pessoas que cruzaram com o destino dele, além de trechos dos autores preferidos de Chris - Tolstoi e Thoreau.
O livro virou filme em 2007 pelo produtor de filmes independentes Ron Lamothe, com o ator Emile Hirsch e participação de Kristen Stuart. A historia também foi inspiração para um episódio da série de TV "Millenium" e canções. Eddie Vedder, da banda Pearl Jam, se disponibilizou para fazer a trilha sonora.
Morando em ônibus no Alasca
A família de Chris ficou sem notícias durante dois anos. Ele nunca deixou nenhuma dica fixa para que pudesse ser achado, mas não era de propósito, só não era necessário, não mais. Ele viveu esses dois anos à margem da sociedade. Chegou ao Alasca e lá permaneceu durante seis meses. Algumas pessoas acham que Chris estava atrás de respostas, mas em minha opinião Chris nunca viveu, ele teve de fugir para poder ser o que queria ser. Era um espírito puro que não foi contaminado por uma suposta realidade. Acho que ele só queria se libertar e estava disposto a sacrificar a própria vida.
Li o livro e assisti ao filme e Chris se tornou uma referência de espírito sempre jovem e livre, ele é a prova de que é possível se desprender da saia da sociedade e continuar vivendo intensamente e de forma filosófica. É uma lenda. Chris escreveu sua história na contracapa de vários livros, com 113 dias registrados. Ele encontrou abrigo em um ônibus de número 142, que hoje é visitado por várias pessoas. Dentro do ônibus também é possível achar registros nas paredes. Chris permaneceu nas montanhas quatro meses, se alimentando do que trazia, de frutas e sementes que colhia na natureza e alguns animais que caçava.
Em 6 de setembro de 1992, dois mochileiros e um grupo de caçadores de alce acharam a seguinte mensagem na porta do ônibus: "S.O.S., preciso de Ajuda. Estou aleijado, quase morto e fraco para sair daqui. Estou totalmente só, não estou brincando. Pelo amor de Deus, por favor, tentem me salvar. Estou lá fora apanhando frutas nas proximidades e devo voltar à noite. Obrigado, Chris McCandless".
Seu corpo foi achado em decomposição em agosto de 1992, embrulhado num saco cama no interior do ônibus, já morto há cerca da duas semanas. A causa da morte foi inanição (estado de grave fraqueza, por falta de alimentos ou defeito da assimilação dos mesmos). Porém, alguns dizem que ele foi envenenado acidentalmente por algumas sementes que ingeriu. Mas terminamos o livro sabendo que ele se foi feliz, ele escolheu ser feliz dessa forma. Ele era um espírito livro que precisava de espaço.
"Não existem nada tão mau, selvagem e cruel na natureza, quanto os homens normais". - Hermann Hesse
Trechos do livro original por Chris
"(...) Sem jamais ter de voltar a ser envenenado pela civilização, foge e caminha sozinho pela terra para se perder na floresta".’
"Dois anos ele caminha pela terra. Sem telefone, sem piscina, sem animal de estimação, sem cigarros. Liberdade definitiva. Um extremista. Um viajante estético cujo lar é a estrada. Fugido de Atlanta, não retomarás, porque o Oeste é o melhor. E agora depois de dois anos errantes chega à última e maior aventura. A batalha final para matar o ser falso interior e concluir vitoriosamente a revolução espiritual. Dez dias e noites de trens de carga e pegando carona trazem-no ao grande e branco Norte. Para não mais ser envenenado pela civilização, ele foge e caminha sozinho sobre a terra para perder-se na natureza selvagem".
Trecho sublinhado em um dos livros encontrados com os restos de Chris McClandless
"Necessidade um objetivo" - Estava escrito com a letra de Chris na margem acima do trecho.
Nas últimas páginas de um dos livros que servia de diário, declarou: "Renasci. Esta é minha aurora. A vida verdadeira apenas começou".
Viver deliberadamente: Atenção consciente ao básico da vida e uma atenção constante ao meio ambiente imediato e o que lhe diz respeito, exemplo - um emprego, uma tarefa, um livro; tudo exigindo concentração eficiente. (Circunstância não tem valor. É como a gente se relaciona com uma situação que tem valor. Todo significado verdadeiro reside na relação pessoal a um fenômeno, o que ele significa para você.) A Grande Santidade da COMIDA, o Calor Vital. Positivismo, a Insuperável Alegria da Estética da Vida. Verdade Absoluta e Honestidade.
Realidade-Independência-Finalidade - Estabilidade - Consistência.
A história de Christopher Johson McCandless está acima de qualquer análise ou crítica. Basta entender e não é preciso dizer mais nada, começamos a sentir como Chris. Afinal, somos todos espíritos tão livres quanto hoje é o de Chris.
> Frente & Verso
. Título: Na natureza selvagem
. Autor: Jon Krakauer
. Editora: Companhia das Letras
. Páginas: 214
. Ano: 1998
. Valor: R$ 19,90