Publicada: 22/05/2017 (11:46:12) . Atualizada: 10/07/2017 (12:34:52)
(Foto Ilustrativa)
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A culpabilidade das redes sociais ou dos sites que proliferam a música gratuita não deveria sequer ser medida ou criticada. A cultura é a face de seu povo, e os homens é que fazem sua própria cultura.
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Postei um vídeo, ou uma canção qualquer. Shazam, um “bum” de acessos e você é convidado por um programa de televisão. Talvez não se trate aí de “qualidade”, mas comumente do número de acessos que aquilo provocou. Por outro lado, esse fenômeno possui “qualidade” para os canais da mídia. Qualidade se torna quantidade e essa o pilar para a divulgação dos momentos sociais. Por que uma canção tocada apenas com um violão e voz ou vozes chama tanto a atenção do público? Mesmo que quando falamos que o vocábulo “qualidade” não esteja no nível de uma ária de Bach, precisamos estar atentos ao “por quê” de tamanho sucesso, (se bem que nível estético é um argumento relativo e proporcional à cultura).
O ouvido humano sempre está à procura de sons repetitivos para que o cérebro comece a gostar de alguma coisa. Não gostamos, às vezes, do sabor de um alimento, porém, com o tempo passamos a entendê-lo e a saboreá-lo. Gostamos principalmente porque sons são repetitivos. Esse é um dos quesitos para o “belo”: “a repetição”. Sabe aquela música que à primeira vista parece chata e feia? Com o passar dos dias vamos nos acostumando com ela e apaziguamos nossos critérios estéticos mais severos, talvez porque onde nos encontramos “a canção da moda” está sempre presente nos ambientes; sem nosso consentimento, porque o ouvido humano não possui uma porta que se abre ou se fecha (ele está sempre atento e aberto a qualquer som produzido para estarmos ligados a eventuais perigos). A mídia se aproveita dessa questão e invade os lugares públicos com suas mensagens. A repetição é um artifício natural aceito pelos instintos humanos, por isso, usado pelas mídias, não como uma esperteza, porém, como convicção dos processos cerebrais aprimorados pela neuro ciência, confirmados pelo seu uso, como explica a teoria da informação.
Muita coisa é postada, muitas músicas, um arsenal infindável, porém, o que “estoura”, seria uma música de qualidade? A qualidade “admite”, ou é conceituada pela simples recreação humana ou entretenimento sem objetivos eruditos? O vale tudo na arte é uma acepção que merece cautela. Para que a arte e para que a música? Objetivos extremamente eruditos de difícil entendimento ou improvável “digestão” do material artístico a ser consumido pela nossa razão não deveriam ser o único objetivo da música ou da arte.
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Se todo o processo artístico se enquadrar numa despreocupação e em uma simples recreação, estaríamos fadados a uma apreciação infantil eterna.
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Muito da filosofia veio principalmente do teatro grego com as tragédias. A comédia que a substituiu viu no domesticismo do diálogo racional e apagou o teor pungente da tragédia. Sendo essa pessimista, junto com sua música, perderam a sua seriedade em detrimento da banalização que a comédia impôs. Se nossa música com suas letras começarem a “deteriorar o pensamento”, a razão humana estará perdida e esquecida em detrimento das banalidades e trivialidades corriqueiras do dia a dia.
A internet e sua “facilidade” em democratizar o futuro, dos ainda inexpressivos, ousa desafiar em alguns momentos e testar, medindo o quanto de erudição existe em seus adeptos que acessam sem parar as redes. Foucault comentou que as grandes ideias de uma sociedade passam por um filtro. Esse gradeamento está sujeito a uma ideologia que subliminarmente purga o que é nocivo a ela. A internet simplesmente oferece oportunidade, todavia, quem a usa e suga seus conhecimentos é responsável por si mesmo e deveria julgar, fazendo um juízo crítico do por quê ouve aquela música. O nível de erudição ou de aceitação vem da educação e não das mídias. O verdadeiro filtro somos nós mesmos, com nossas convicções e desejos profundos. A manipulação muitas vezes aludida por críticos da cultura deveria ser dirigida à forma pela qual os educadores formam seus discípulos e alunos. A culpabilidade das redes sociais ou dos sites que proliferam a música gratuita não deveria sequer ser medida ou criticada. A cultura é a face de seu povo, e os homens é que fazem sua própria cultura. A erudição é escolha de poucos, a imposição dela, como ideologia, está atrelada a um desejo de que todos os homens deveriam aprofundar seus conhecimentos, porém a moral e a ética não deveriam ser impostas, porque a liberdade em se divertir para alguns é melhor do que racionalizar uma canção e ficar procurando filosofias que estão sempre em antagonismos.