Publicidade

RH

Arte e Lazer

Por que se ouve mais a música popular?

A diferença entre o popular e o erudito é a quantidade de vezes que se ouve

Música  –  10/06/2018 10:41

1

(Foto Ilustrativa)

_______________________________________________________

O segredo de ouvir a música erudita é o de ouvir muitas vezes até que ela seja digerida

_______________________________________________________

> Confira todas as colunas "Descobrindo a Música", assinadas pelo músico Ricardo Yabrudi

Alguns confundem a arte com o lazer, obviamente não são a mesma coisa, nem mesmo o mesmo assunto, entretanto, os misturam em uma salada e os mesclam. No lazer não se trabalha, porém, se curte a vida, sem, no entanto, querer curti-lo é fazer e não fazer - é não se importar para o que se faz, e se o faz, não se importa se o fez. O lazer é o descompromisso com tudo, é deixar o barco rolar em suas atividades, discordantemente, a arte exige o máximo do homem por ser a única atividade que responde ao mundo de forma crítica, ousada e incomum, frente às outras espécies. Um texto literário comportará muito mais conotações do que um texto comum, burocrático.

A arte exige do homem, que a pretende entender, uma grande “reflexão”! No lazer isso não é necessário. Na arte, o “fruidor”, passa de um mero ser instintivo para um ser questionador, pensante, metafísico e crítico. Quando miramos uma pintura de Salvador Dali ou uma Tarsila do Amaral revolvemos todos os nossos conceitos e os colocamos novamente em cheque, em discussão. Na música poderia ser diferente, porém, quem não tem a astúcia e o conhecimento mínimo do conhecimento da história da harmonia e a complexidade do contraponto, dificilmente não conseguirá enxergar nada mais do que um lazer efêmero e diletante. Existe a música para o lazer, porém, não é nossa questão aqui neste ensaio. A nossa intenção também é o de avaliarmos quão longe foi a criação musical humana e para quem ela foi escrita. Para quem será que Beethoven escreveu suas sinfonias? Para todos diria, porque nunca é tarde para aceitarmos desafios. Nunca é tarde para imaginarmos um nível coletivo de aceitação para elementos artísticos mais profundos e complexos.

No dia em que o erudito possuir um entendimento coletivo de proporcionalidade expressivo, se mesclará com o popular com certeza. Essa divisão preconceituosa entre erudito e popular é a mesma quando crianças mais velhas brincam com crianças de menos idade (quando as primeiras não levam a sério a coletividade). Se olharmos para trás, a história da música vai nos informar que em períodos como a Renascença havia canções para alaúde e voz que eram apreciadas por toda a camada da população e não só os da corte “culta”. O próprio hino nacional brasileiro é uma composição belíssima e verdadeiramente apreciada por todo o nosso povo. Sua harmonia e melodia são riquíssimas ao nível de composições eruditas. A verdade é que: se apreciam é porque entenderam sua harmonia e melodia, e se nós nos emocionamos é porque ouvimos o hino centena de vezes, e nosso entendimento está aprofundado.

O segredo de ouvir a música erudita é o de ouvir muitas vezes até que ela seja digerida. Com as inúmeras audições, o erudito, como o hino, vai se popularizar. A diferença entre o popular e o erudito é a quantidade de vezes que se ouve. O homem tem uma complexidade neural muito elevada. Sua compreensão metafórica é infinita. A compreensão das formas cultas é como a compreensão de uma piada de difícil compreensão, se não entendermos na primeira audição alguém nos explica. A música erudita é assim, se não entendemos alguém nos guia e nos explica. A música popular já tem essa facilidade de entendimento, por isso é mais ouvida. Músicas eruditas têm esse rótulo de estarem popularizadas, são, por exemplo, as músicas executadas nos casamentos, como a Ária da Quarta Corda e algumas obras de Vivaldi como a “Primavera”, por exemplo. Essa popularização do erudito é benéfica desde que não fique estagnada. Alguns eventos domésticos preferem repetir o que já se entende, pelo menos superficialmente, o que não renova o repertório para os ouvintes, sendo prejudicial para o crescimento e desenvolvimento do gosto pelo “culto” e a desmistificação da diferença entre ambas.

O erudito requer o desafio e o novo. Já as formas populares estão sempre repetindo formas mais fáceis de digestão estética. A acomodação é um fator compreensível em todas as áreas do viver humano. Deitar em um sofá é preferível do que carregar pedras. Fundir a cabeça com formas harmônicas complexas não é um modo muito preferível do deleite, contudo apropriar-se do relaxamento musical tem seus méritos instantâneos. A vida corrida requer relaxamento. O mais fácil de digestão intelectual é o predileto de grandes camadas da população.

Por que tenho que pensar, dizem os acomodados?
Não é a arte diletante? Por acaso música é filosofia?
Quero apenas me divertir e ver a banda passar, ou ouvir a banda passar. Temos razão de sobra para concordar com a maioria.
Será que ninguém deveria mais chupar uma bala ou mascar uma goma?
Comer algodão doce também tem sua hora no parque de diversão ou em uma festa infantil onde nos tornamos criança de novo com nossa prole. A facilidade é fator preponderante no ouvir a música popular. O cardápio será sempre o de maior digestão. As mídias que oferecem o menu musical ditam as regras. É o fast food musical em detrimento do slow food na música.

_______________________________________________________

Por Ricardo Yabrudi  –  yabrudisom@hotmail.com

Seja o primeiro a comentar

×

×

×