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Nada melhor do que se esticar numa rede e cantarolar com o acompanhamento de uma viola. Redes também estão dentro da oca balançando com os cantos monódicos (cantos sem polifonia). A melodia é formada de notas sucessivas como se ouve nas cantigas de roda. Lá, dentro dessas ocas, vive uma multidão de parentes. A formação indígena baseada nas primitivas gens (constituição gentílica) preserva sua cultura, principalmente através de seus cantos simples, melódicos.
Por isso, estão preservados, sendo facilmente aprendidos - é o conforto, tanto para a voz frágil quanto para sua saga que ensina os costumes de gerações em gerações. Assim, o foi também o ensinamento através das nove musas da antiga Grécia educando o povo grego infantil através da música monofônica, a melódica, na Paideia (era a educação infantil através da música e da ginástica até os 12 anos de idade). Não há como negar esse conforto que a melodia traz consigo evitando o exercício auditivo árduo polifônico que exige muita atenção e estudo, ouvidos de lince e perseverança no quadrivium.
A linha melódica é a espinha dorsal na música monofônica. Tem sua origem no primitivo balbuciar de notas, todavia, imperou na música clássica como guia condutora ganhando ares e respeito no clube erudito. Nos recitativos entoou forte, anunciando a destreza vocal de seus intérpretes. As divas brilhavam como o sol resplandecendo nos palcos italianos.
O “bel canto”, o belo canto, inundava os teatros no classicismo, enchendo a sala com a melodia acompanhada da orquestra servil. Essa era a época dos solistas vocais criando uma figura desejada como ídolos. Seguiu-se na música pop, assim como nos frágeis menestréis medievais, uma idolatria calcada no uso da melodia como senha e roteiro de um protagonista músico que inauguraria a fama e o sucesso. A melodia destaca o intérprete! A orquestra é nesses casos apenas o pano de fundo para acompanhar o que deve ser ouvido na singeleza de notas em sequência.
A polifonia nesses casos deve esperar ou apenas se contentar em criar bases harmônicas para um sinuoso passeio pelas escalas. A melodia imperativa volta ao seu berço. Ela se desculpa por não ser tão complexa porque não quer confundir os ouvidos delicados de quem não quer ouvir dezenas de vezes um madrigal para entendê-lo profundamente. Ela afirma:
- Sou como uma linha que costura minhas próprias vestes talares, meu manto. Eu sou a alma da obra musical, o acompanhamento da orquestra, só o corpo!